Apenas Neymar ofusca David Luiz na concentração de Teresópolis: é o mais acessível, simpático, fotogênico e se expressa com fluência. As fãs enlouquecem com a sua chegada. Seu golaço de falta contra a Colômbia e seu gesto abraçando o novo e desconsolado craque colombiano depois da partida moldaram definitivamente sua imagem. "Foi o ano inteiro treinando no Chelsea. Sabia que um dia Deus iria me abençoar", disse no gramado de Fortaleza. Aos 27 anos, parece tocar o céu com a ponta dos dedos. "Como não vou estar feliz?", reconheceu há duas semanas. "Aprendi desde garoto a valorizar o sorriso, a celebrar a vida. Tenho a melhor profissão do mundo".
A explosão de popularidade de David Luiz pode ser medida: tem contratos com a Pepsi, TAM, Nike, operadora Vivo e com a cooperativa de assistência médica Unimed. Acumula três milhões e meio de seguidores no Twitter e muitos outros no Instagram, um de seus passatempos favoritos. Sua facilidade com as palavras lhe permite dar entrevistas coletivas de quase uma hora. Depois, em vez de desaparecer rapidamente, atende aos meios de comunicação, dá autógrafos, tira fotos com os fãs e até encontra tempo para empinar pipa (outro de seus passatempos) e transformar-se no alvo perfeito para centenas de fotógrafos a postos na tranquila Granja Comary, onde a equipe se prepara para a semifinal contra a Alemanha.
O futebol latino-americano é pródigo em infâncias traumáticas e adolescências complicadas. A trajetória de David Luiz também não foi um caminho de rosas. Nascido em São Paulo, saiu de casa aos 14 anos para tentar a sorte no Vitória, equipe de Salvador, na Bahia (que agora, pelo contrato do PSG, receberá mais de três milhões de reais pelo Mecanismo de Solidariedade da FIFA). Em sua cidade natal não teve oportunidades: era considerado muito baixo (hoje mede 1,89). Na Bahia, jogava como meio de campo, mas tampouco convencia os técnicos. Mas quando ia ser transferido, teve que substituir um dia um zagueiro contundido e... aí ficou. Aos 20 anos já estava em Portugal. "Sei o quanto lutei", afirma agora, com uma Champions no bolso (Chelsea, 2012) e a 180 minutos de conquistar a Copa.
Diante da lesão de Neymar e da inércia de Fred, o Brasil agora depende de sua zaga. Na seleção Canarinha e, partir de agosto, no PSG, David Luiz forma a dupla de centrais com Thiago Silva, capitão da seleção, o terceiro zagueiro mais caro da história. Com a dupla no campo, a equipe tem uma porcentagem de vitórias de 85%; sem eles, cai para 50%. Além de proteger o gol do renascido Julio César, organizar a equipe e ter muita capacidade técnica para lançar Neymar e Hulk com passes longos, os zagueiros marcaram os dois gols contra a Colômbia. Sem Thiago Silva devido ao número de cartões amarelos, David Luiz será o líder do Brasil na terça-feira em Belo Horizonte. À beira das lágrimas, pálido como se houvessem sido derrotados, o jogador reagiu emocionado à notícia da fratura vertebral do camisa 10 brasileiro: "Faremos algo para apoiá-lo e para demonstrar a força da equipe sobre o campo".
Os paradoxos da vida levaram David Luiz a jogar de novo no meio de campo, como ocorreu em várias ocasiões com Mourinho no Chelsea nesta última temporada. "Sinto a pressão", reconhecia o zagueiro no dia da convocação brasileira para a Copa. "Todo o povo brasileiro está esperando uma vitória. Mas te faz sentir vivo". Não parece que seja o caso mais difícil de tratar pela equipe de psicólogas contratada por Scolari, para ajudar os jogadores a lidar com a responsabilidade que implica jogar uma Copa em casa. "Estou muito orgulhoso e me sinto privilegiado. É um momento único, mágico. A Alemanha e a Itália disputaram dois Mundiais em casa. Ganharam uma partida. Nós perdemos a primeira... [O Maracanazo do Uruguai em 1950]. Esta não escapa".
in El País
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