sexta-feira, 16 de março de 2012

EXTRA

É um relato que descreve a situação. Um jogador que já defrontou o seu antigo clube e jogadores que achavam que estava no papo.
O jogo já aqueceu fora do campo e pelos vistos já é esperada uma recepção não tão simpática para um jogador do Chelsea...

“É preciso sair do país para enxergar o prestígio e o tamanhão do Benfica em todo o mundo. Estive três anos em França, no Marselha, joguei num estádio fantástico, o Vélodrome, convivi com grande jogadores como Papin e Waddle, mas o Benfica estará sempre no meu pensamento.

Os meus companheiros de equipa não percebiam muito o meu entusiasmo pelo

clube, já que sabiam pouco do futebol português, embora reconhecendo o tremendo historial do Benfica.

Durante os primeiros tempos tive de aturar os comentários de Papin, logo desde o inicio, sempre que jogávamos em casa.

Uns dias antes de cada jogo, o Papin chegava para mim e me dizia:

“Mozer, vais ver o que é um estádio cheio e um ambiente terrível.”

Terrível para os outros. Não sei se o se o Papin dizia isso para me intimidar, já que era novo no clube e não percebia muito daquela conversa.

Mas para mim, sempre pensava: “Este cara precisava de jogar no Maracanã ou no estádio da Luz, cheios.” Era o que eu pensava.

Até que, na taça dos campeões, nas meias-finais, o Benfica calhou no caminho do Marselha. Fiquei, ao início, desgostoso, porque ia defrontar o meu Benfica, o clube que os meus companheiros sabiam que eu adorava. Me lembro de Sauzée, o meu zagueiro do lado me ter perguntado: “Você vai estar em condições de jogar contra o Benfica?”

Aí, senti que beliscavam o meu profissionalismo. Nos dois, jogos joguei a duzentos por cento.

Depois do primeiro jogo, em Marselha, uns dias antes de jogarmos na Luz, virei para o Papin e lhe perguntei: ” Papin, voçê quer mesmo ver o que é um estádio cheio, com 120 mil a gritar todos para o mesmo lado?” Engraçada a reacção do Papin: “Voçê, está querendo me meter medo, Mozer?”

Não estava não e por isso lhe disse para esperar para ver. E já agora, tremer.

Pois bem, chegou o dia, chegámos no estádio da Luz e fomos logo indo para os balneários. Muitos risos, muita convicção de que íamos jogar a final da Copa dos Campeões. Lembro até que Tapie disse aos jornalistas franceses que lhe podiam chamar de Bernardette se o marselha perdesse a eliminatória.

Antes de subirmos ao relvado, para o aquecimento, Papin ainda troçou de mim, dizendo que estava já “tremendo de medo”. E ria-se bastante.

Os jogadores foram saindo do balneário e eu atrasei um pouco, porque estava colocando uma ligadura no tornozelo.

Quando cheguei perto do túnel de acesso ao estádio, começo a ver os meus companheiros, compeletamente assustados e todos do lado de dentro, não querendo entrar.
Só depois percebi que, nessa altura o Eusébio foi chamado ao relvado para receber uma homenagem e foi aí que o estádio quase vinha abaixo. Logo no momento em que os meus companheiros do Marselha se preparavam para entrar.

Claro que voltaram atrás assustados e me perguntado: “O que era aquilo?”.

Aquilo respondi eu, é o INFERNO DA LUZ. Aí todos me começaram a me dizer para ser eu o primeiro a avançar, subi as escadas, entrei no relvado, não fui mal recebido e quando olhei para trás, estava sózinho. Espreitando, àsaida da escadaria estavam alguns dos meus companheiros do marselha, ainda com um olhar de medo e só nessa altura começaram a entrar.

No regresso às cabinas, perguntei a Papin: “Já sabes agora o que é um estádio cheio e um grande ambiente?”

A resposta, nunca mais a esqueci: “Mozer, nunca vi uma coisa destas. Tudo isto é incrível. Sempre tiveste razão, o Benfica é ENORME!”

Naquela noite, o Marselha perdeu, fiquei triste mas senti orgulho pelo Benfica. E já agora, naquele balneário, fui o único a ter uma vitória.

Foi uma vitória moral, sobre aqueles que não acreditavam na grandeza do Benfica.”


José Carlos Mozer

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