O ano era 2005. Tetracampeão da Philips Cup, atualmente chamada de Otten Cup, o Vitória embarcava em busca do quinto título na Holanda. Os garotos de até 20 anos levavam na bagagem a missão de honrar uma das principais divisões de base do Brasil. Em solo europeu, os Leõezinhos derrotaram o PSV Eindhoven na final e retornaram para Salvador com o troféu em mãos. O grupo era recheado daquelas jovens promessas, mas nem os mais otimistas poderiam prever que dois daqueles meninos estariam juntos novamente nove anos depois com a missão de honrar a seleção pentacampeã do mundo.
Eram jogadores completamente diferentes. Um esquentado, o outro pacificador. Um atacante, o outro zagueiro. Um forte, o outro magro. Mas os dois tinham o mesmo objetivo: dar alegria e ajudar a família. Tiveram destinos diferentes, mas, coincidência ou não, os dois têm um novo objetivo em comum: dar alegria a milhões de brasileiros. É assim que Hulk e David Luiz reeditarão a parceria que tiveram com a camisa rubro-negra na Copa do Mundo no Brasil.
Crias das divisões de base do Vitória, o zagueiro e o atacante não eram nem zagueiro nem atacante quando chegaram à Toca do Leão. Um jogava no meio, o outro fazia a função de lateral. Foram moldados, adaptados e deslancharam. Tiveram apenas o time baiano como experiência profissional no Brasil. Fizeram carreira e nome na Europa até se tornarem peças importantes na lista de Luiz Felipe Scolari.
Com os dois jogadores de volta ao Brasil para a disputa do Mundial, o GloboEsporte.com revela alguns detalhes da passagem deles pelo Vitória. David Luiz e Hulk trilharam caminhos diferentes desde que deixaram a Toca do Leão, mas levam no peito algo que os une: o amor pelo rubro-negro baiano.
Para David Luiz, não foi fácil ingressar no mundo do futebol. Por ser considerado muito magro para os padrões da adolescência, foi dispensado do São Paulo e quase teve o mesmo destino no Vitória. Na fase em que os garotos costumam dar a "esticada", David atuava como volante e, com a transformação do corpo, tornou-se bastante desajeitado dentro de campo.
A liberação dele estava pronta para ser assinada. O documento chegou às mãos de João Paulo Sampaio, então auxiliar da categoria júnior, às vésperas de uma viagem. Designado para comandar a equipe na competição, o atual coordenador de futebol decidiu esperar o torneio para sacramentar a saída de David Luiz e outros dois jogadores. Foi a sorte do atleta.
- Nós gastamos 78 horas para chegar a Santiago, no Rio Grande do Sul. No outro dia, jogamos contra o Atlético-MG, e estava todo mundo cansado, sentindo câimbras. David era volante e estava no banco. Sem opção, coloquei ele como líbero. Foi aí que ele começou a atuar na zaga – lembra João Paulo.
Foi por acaso que David Luiz não foi liberado do clube baiano, mas foi pela obstinação que ele continuou na Toca do Leão. Adolescente, David sentia bastante saudade da família. Passou a morar nas dependências do Vitória e era visto com frequência em baixo de uma mangueira próxima ao refeitório do clube. O choro se tornou constante no dia a dia do jogador. Nada que o fizesse desistir.
- Esse aqui é meu sonho – dizia o zagueiro.
O sorriso só saía do rosto do jogador quando ele lembrava da família. Apesar de ser centrado e bastante responsável desde cedo, David era também muito brincalhão. Ao lado de Uelliton, que hoje está no Bahia, era ele quem comandava as brincadeiras nas divisões de base do clube.
Após vencer a desconfiança e a saudade, era hora de mostrar trabalho. Vontade nunca faltou a David Luiz. O supervisor Mário Silva cansou de encontrar o zagueiro na academia do clube. Nos turnos opostos aos treinos, o paulista se mantinha em atividade. Parte dela estava incluída no projeto “Massa”, feito para que ele ganhasse peso.
Dos encontros vespertinos nasceu uma amizade entre os dois, mesmo com David ainda na divisão de base. Responsável pelas questões do profissional, Mário Silva se impressionava com a força de vontade daquele garoto.
- A vontade dele sempre foi maior que a de todos. Sempre acreditou muito em si mesmo, sempre foi muito obstinado. Achava que podia e ia ser. Também sempre foi muito humilde – comenta.
A determinação rendeu uma chance entre os profissionais no final de 2005. O primeiro técnico a dar oportunidade foi Arthurzinho. Com o Vitória sem grandes condições financeiras, o treinador deu mais espaços à base. Wallace e Anderson Martins já formavam a dupla de zaga – em um time que contava também com Marcelo Moreno. David Luiz chegou para completar o trio.
Um dos meus atritos com ele era porque ele largava a defesa e ia para o ataque, tamanha era a confiança que tinha.
Em 2006, o zagueiro se firmou como titular e roubou a cena. Um dos destaques foi um jogo contra o Santa Cruz, pela Copa do Brasil, no Arruda. Na defesa, David dava conta do recado, mas preocupava quando decidia se arriscar mais à frente.
- Um dos meus atritos com ele era porque ele largava a defesa e ia para o ataque, tamanha era a confiança que tinha. Pela vontade imensa de vencer, de vez em quando ele ia ao ataque em momento que não era adequado. Tinha muita personalidade e não admitia perder – lembra Arthurzinho, que atualmente encontra-se sem clube.
No Vitória, foram apenas três competições completas: Campeonato Baiano, Copa do Brasil e Série C do Brasileiro. No segundo semestre de 2006, o zagueiro começou a chamar atenção dos clubes estrangeiros. Para Arthurzinho, o mercado se abriu pelo estilo de jogo do atleta. Segundo ele, David Luiz sempre foi veloz, técnico e com personalidade.
A primeira oportunidade de o Vitória vender o zagueiro surgiu com o interesse do clube belga Anderlecht. Os europeus vieram ao Brasil para avaliar o atleta, mas a goleada sofrida por 6 a 0 para o Criciúma melou a negociação.
Coisas do destino. Dois meses depois, surgiu a proposta do Benfica. David fez apenas um jogo pelo Baiano de 2007. Aos 19 anos, o zagueiro se despediu da Toca do Leão. Deixou saudade, principalmente nos funcionários mais humildes. A mangueira na qual ele tanto se apoiou para chorar continua lá. De vez em quando, recebe a visita do zagueiro da Seleção. Mas hoje as lágrimas não são de tristeza, e sim de alegria.
(...)
A liberação dele estava pronta para ser assinada. O documento chegou às mãos de João Paulo Sampaio, então auxiliar da categoria júnior, às vésperas de uma viagem. Designado para comandar a equipe na competição, o atual coordenador de futebol decidiu esperar o torneio para sacramentar a saída de David Luiz e outros dois jogadores. Foi a sorte do atleta.
- Nós gastamos 78 horas para chegar a Santiago, no Rio Grande do Sul. No outro dia, jogamos contra o Atlético-MG, e estava todo mundo cansado, sentindo câimbras. David era volante e estava no banco. Sem opção, coloquei ele como líbero. Foi aí que ele começou a atuar na zaga – lembra João Paulo.
Foi por acaso que David Luiz não foi liberado do clube baiano, mas foi pela obstinação que ele continuou na Toca do Leão. Adolescente, David sentia bastante saudade da família. Passou a morar nas dependências do Vitória e era visto com frequência em baixo de uma mangueira próxima ao refeitório do clube. O choro se tornou constante no dia a dia do jogador. Nada que o fizesse desistir.
- Esse aqui é meu sonho – dizia o zagueiro.
O sorriso só saía do rosto do jogador quando ele lembrava da família. Apesar de ser centrado e bastante responsável desde cedo, David era também muito brincalhão. Ao lado de Uelliton, que hoje está no Bahia, era ele quem comandava as brincadeiras nas divisões de base do clube.
Após vencer a desconfiança e a saudade, era hora de mostrar trabalho. Vontade nunca faltou a David Luiz. O supervisor Mário Silva cansou de encontrar o zagueiro na academia do clube. Nos turnos opostos aos treinos, o paulista se mantinha em atividade. Parte dela estava incluída no projeto “Massa”, feito para que ele ganhasse peso.
Dos encontros vespertinos nasceu uma amizade entre os dois, mesmo com David ainda na divisão de base. Responsável pelas questões do profissional, Mário Silva se impressionava com a força de vontade daquele garoto.
- A vontade dele sempre foi maior que a de todos. Sempre acreditou muito em si mesmo, sempre foi muito obstinado. Achava que podia e ia ser. Também sempre foi muito humilde – comenta.
A determinação rendeu uma chance entre os profissionais no final de 2005. O primeiro técnico a dar oportunidade foi Arthurzinho. Com o Vitória sem grandes condições financeiras, o treinador deu mais espaços à base. Wallace e Anderson Martins já formavam a dupla de zaga – em um time que contava também com Marcelo Moreno. David Luiz chegou para completar o trio.
Um dos meus atritos com ele era porque ele largava a defesa e ia para o ataque, tamanha era a confiança que tinha.
Em 2006, o zagueiro se firmou como titular e roubou a cena. Um dos destaques foi um jogo contra o Santa Cruz, pela Copa do Brasil, no Arruda. Na defesa, David dava conta do recado, mas preocupava quando decidia se arriscar mais à frente.
- Um dos meus atritos com ele era porque ele largava a defesa e ia para o ataque, tamanha era a confiança que tinha. Pela vontade imensa de vencer, de vez em quando ele ia ao ataque em momento que não era adequado. Tinha muita personalidade e não admitia perder – lembra Arthurzinho, que atualmente encontra-se sem clube.
No Vitória, foram apenas três competições completas: Campeonato Baiano, Copa do Brasil e Série C do Brasileiro. No segundo semestre de 2006, o zagueiro começou a chamar atenção dos clubes estrangeiros. Para Arthurzinho, o mercado se abriu pelo estilo de jogo do atleta. Segundo ele, David Luiz sempre foi veloz, técnico e com personalidade.
A primeira oportunidade de o Vitória vender o zagueiro surgiu com o interesse do clube belga Anderlecht. Os europeus vieram ao Brasil para avaliar o atleta, mas a goleada sofrida por 6 a 0 para o Criciúma melou a negociação.
Coisas do destino. Dois meses depois, surgiu a proposta do Benfica. David fez apenas um jogo pelo Baiano de 2007. Aos 19 anos, o zagueiro se despediu da Toca do Leão. Deixou saudade, principalmente nos funcionários mais humildes. A mangueira na qual ele tanto se apoiou para chorar continua lá. De vez em quando, recebe a visita do zagueiro da Seleção. Mas hoje as lágrimas não são de tristeza, e sim de alegria.
(...)
in Globo Esporte
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